segunda-feira, 28 de julho de 2008

Paixão de professora - parte 1

Em tempos de constante depreciação do professor, sinto uma corrente cada vez mais comum entre a classe: "Ah, minha filha... Estude, faça um concurso público; isso não é vida..." Mas p.q.p.!!!!!!!!! Estudei e fiz concurso; do contrário, não estaria dividindo espaço com as pessoas que sempre vêm com essa frase de suposto efeito - um colégio... público!

Apesar da tenra experiência docente, existem coisas que já me deixam extremamente cansada e entediada no meio: gente extremamente cansada e entediada com a profissão, que não faz NADA para mudar isso! Ora, se você faz alguma coisa que não lhe dá o mínimo de prazer e de força propulsora, acaba ficando impossível fazê-la! E antes que algum leitor pense que estou sendo leviana e insensível às dores e às necessidades dos colegas, advirto: trabalhar em algo de que se gosta é, para mim, uma questão de sobrevivência.
Continua...

Paixão de professora - parte 2

Em primeiro lugar, acordar bem cedo nem sempre é tarefa das mais fáceis, principalmente se você passou por infortúnios noturnos como: um mal-estar que te obrigou a passar mais tempo no banheiro do que na cama, um baile funk que cismou em se estender por toda a madrugada, uma pilha de avaliações para corrigir, um bebê que chorou incessantemente... Enfim, levantar para mais um dia de labuta depois de ter passado a noite com esses parceiros (que podem resolver se juntar, para melhor te satisfazerem) é dose! E se você for direto para uma escola que muitas vezes se assemelha a um campo de batalha ou a um hospício, após algum tempo algo vai para o beleléu: sua sanidade. Ela é o boi de piranha do profissional insatisfeito, principalmente o professor. O resto da boiada é composto por garganta, estômago, coração, músculos, coluna (não necessariamente nesta ordem).

O que dizer do trajeto casa-trabalho? Sair do sagrado lar e ter que pegar uma, duas - e sei lá quantas - conduções para ir ao matadouro que se torna a escola para um professor infeliz, não pode ter outro nome se não suicídio.

E quando chega a hora de cumprir o ofício propriamente dito? Muitos profissionais se esquecem de que, para ensinar, é preciso, antes de tudo, aprender. Mas, infelizmente, ouço muito as máximas: "Nem sabia disso, no quê isso vai mudar minha prática?", "Tantos anos de experiência, para quê vou mexer com isso ou aquilo?" Quando escuto frases como essas, fico realmente muito triste; se os próprios professores acham que não aprenderão algo só porque este algo é novo em suas vidas, como convencerão seus alunos do mesmo? É bom atentar para essa atitude de negação ao novo, tão criticada nos alunos e, ao mesmo, tão presente entre os professores.

Além da disposição física e intelectual em ensinar, há outra igualmente importante: a emocional. Uma vez que a Educação envolve nada mais, nada menos do que pessoas – com todo o arcabouço visceral-mental-sentimental – a mesma requer profissionais saudáveis emocionalmente, que consigam lidar com diversas situações espinhosas (principalmente quando não há qualquer apoio de outras instâncias de poder e ação dentro das instituições de ensino). Sim, sabemos que o magistério pode minar a saúde emocional de um professor. E se o professor está simplesmente com ojeriza ao seu trabalho - que ele odeia com todas as letras e forças – este passa a funcionar como um catalisador no processo de ruína mental; um tiro no pé.
Continua...

Paixão de professora - parte 3

Bom, expus minhas razões e meus argumentos; talvez o leitor (se este de fato existir) retruque: "É fácil falar e blá, blá, blá...". Antes de tudo, não é fácil falar, tampouco escrever sobre o assunto (!), mas vamos lá. Trabalho em um colégio estadual longe à beça de casa e tenho que pegar duas conduções para chegar ao colégio (o que muitos trabalhadores brasileiros fazem). A primeira aula começa às sete horas da manhã. É sair de casa amanhecendo...

Ah, e quando chego ao colégio, o que encontro? Alunos desestimulados, falta de recursos, agressividade crescente contra os professores etc. Logo, podemos ver que não é fácil e "só flores" para ninguém, inclusive para mim.

Mas sabe por que encaro todo esse pacote, além de, é claro, precisar ganhar dinheiro? (não sejamos hipócritas e sentimentalóides...) Porque gosto!! Se não gostasse, já estaria em outro lugar, fazendo outra coisa, há muito tempo. Acordar, levantar, pegar condução, ficar suja de tinta, explicar a mesma coisa zilhões de vezes e não ter nenhuma satisfação nisso parece-me contraditório, estapafúrdio e doentio.

É... Já deve ter ficado clara a minha posição sobre o magistério, não é? Não tem como negar: arrisco dizer que amo o que faço. Mesmo sabendo que muitas pessoas - e até mesmo colegas - me criticam por ser apaixonada pelo meu ofício, não estou "nem aqui". Mas a elas, só posso externar com palavras ditas e/ou escritas o quão prazeroso é ver aquele monte de aluno querendo fazer perguntas; o brilho nos olhos do menino que associa o que ele está aprendendo com o que ele viu em casa no dia anterior; daquele "ah, professora, agora eu entendi!", em um brado no meio da sala de aula e tantas outras experiências que fazem tudo valer a pena (sério, sem pieguice).

Apesar de achar que nós professores devamos falar a mesma linguagem, ouso destoar de muitos colegas. Sim, gosto muito de ser professora e acho que tenho algo que muitos não têm (por motivos que não cabem a eu julgar): o prazer de trabalhar naquilo que gosta, tendo a certeza de estar no lugar certo, fazendo o melhor que pode. Sou professora e satisfeita, a despeito do que muitos acham ser uma combinação impossível: magistério e realização.

Ufa!